quinta-feira, 25 de junho de 2009

DOSSIÊ ÁGUA - PARTE II

DOSSIÊ ÁGUA – PARTE II
Por THEREZA VENTUROLI

A água que se usa em casa, aquela que sai de torneiras e chuveiros, representa uma pequena parcela de tudo o que cada cidadão consome – no total apenas 10% do consumo mundial. Para o consumidor doméstico, os restantes 90% vêm na forma de água invisível, dissolvida nos mais diferentes produtos e atividades. A agricultura é, de longe, a responsável pelo maior consumo de água. Cerca de 70% do que é extraído dos rios e aqüífero se destina à produção agropecuária. A fim de garantir safras de arroz, trigo e leite, o homem já reduziu a vazão de grandes rios em até 75%. A indústria é responsável pelos 20% restantes do consumo. Apesar de toda essa água ser captada e usada nas fazendas e na fábricas, uma parcela sempre chega a cada cidadão. O total de água consumida direta ou indiretamente por um individuo ou por toda uma população no decorrer de certo período recebe o nome de pegada hídrica. A pegada hídrica leva em conta não apenas a água agregada aos produtos, mas também o volume poluído na cadeia produtiva.
Entre 1997 e 2001, o comércio internacional transferiu de um país a outro algo em torno de 1 trilhão de metros cúbicos de água virtual por ano, apenas em produtos agropecuários. Se incluirmos aí os produtos industriais, o fluxo anual de água virtual superou o 1,6 trilhão de metros cúbicos. Desse total, 61% do volume viaja invisivelmente em grãos, e outros produtos vegetais, animais e derivados representam 17%. Os produtos industriais utilizam 22% - ou seja, 88% da água virtual transferida entres nações diz respeito diretamente à alimentação da humanidade. O Brasil está entre os maiores exportadores de água virtual do mundo, em companhia dos Estados Unidos, Canadá e França. Mas, como todas as demais nações, também importamos água virtual. O comércio internacional de água virtual democratiza o acesso à água, mas ameaça exaurir as fontes dos exportadores.
É lógico imaginar que os países com maior escassez hídrica apresentam maior saldo positivo no balanço comercial da água virtual – ou seja, seria de esperar que quem dispõe de menos água importe mais produtos e, assim, consuma mais água virtual estrangeira. É o caso de Kuweit, Arábia Saudita, Jordânia, Líbano e Israel, que, não tendo fontes suficientes para irrigar as plantações precisam importar alimentos. Por fim, uma vez que a agricultura consome muito mais água do que a indústria, as nações exportadoras de alimentos degradam suas reservas hídricas mais do que as industrializadas.
Pensar em cobrar pelo uso da água soa estranho. No entanto, em tempos de economia globalizada, em que os mercados se entrelaçam e ditam as regras, a crescente escassez é um argumento para transformar o bem natural em bem acessível apenas a quem possa pagar. Na verdade, o brasileiro não paga nada pela água. O valor da conta mensal refere-se aos custos de captação, tratamento e distribuição. A água em si, não tem preço.

Fonte: Revista ATUALIDADES, 1º Semestre 2009.

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