quarta-feira, 1 de abril de 2009

SEMANA SANTA

SEMANA SANTA
“Vão e preparem tudo para comermos a Páscoa”
(Lucas 22, 8).
* Eraldo Amorim
Depois de longo período de preparação, de expectativa e de reflexão em torno da Campanha da Fraternidade, chegamos a Semana Santa com um grande desafio: resgatar o seu significado maior, e transformá-la em dias de oração, nos remetendo àquela Páscoa em que o Filho de Deus encarnado percorre o caminho da cruz até o túmulo vazio, domingo da Ressurreição.
Na Semana Santa, conhecida também como Semana Maior, contemplamos a cruz que sustenta em seus braços o próprio Deus feito homem, que devido a sua condição humana, a sua missão profética e a sua obediência ao Pai incomodou poderosos do seu tempo, falou das coisas verdadeiras, iluminou a sociedade com sua luz e derrubou tabus que excluía. Veio nos oferecer sua Paz, e por isso morreu de forma tão violenta. Nossas atitudes o mataram, nossos pecados o fizeram sofrer.
Antes de chegar à glória, teve que passar pela cruz. ”Do mesmo modo como Moisés levantou a serpente no deserto, assim é necessário que o Filho do Homem seja levantado”. Linguagem difícil de compreensão em tempos da Teologia da Prosperidade, onde se promete estabilidade financeira, vitória fácil e uma vida sem problemas, só de vitórias. Negar ou esconder a cruz é impedir que a manifestação plena da missão de Jesus se revele. Pois sua vida foi de cruz e de glória ao mesmo tempo. Reflitamos, portanto, os aspectos centrais da Semana Santa.
Desde o período muito cedo de sua história a Igreja celebra os últimos dias de Jesus na terra atualizando o seu sofrimento, sua paixão, seu martírio na cruz até a glória da Ressurreição. A Semana Santa começa no Domingo de Ramos onde celebramos a entrada triunfante de Jesus em Jerusalém. O Mestre aclamado pelo povo como rei, caminha para o calvário sete dias depois. O povo que grita “Hosana! Salve! Bendito o que vem em nome do Senhor” é o mesmo que na sexta-feira manobrados pelos poderosos fariseus exclama “crucifica-o!”. O povo espera um Messias poderoso, forte e que com armas em punho derruba o sistema opressor. Jesus frustra a todos com sua atitude pacifica. Montando num jumentinho ele traz um novo messianismo. Vencer a estrutura pecaminosa com misericórdia e amor.
O Tríduo Santo começa na Quinta-feira, onde fazemos memória daquela ceia derradeira em que o Mestre se abaixa diante dos pés calejados e sujos dos discípulos para lavá-los, num gesto de extrema humildade e de serviço. “Dei-vos o exemplo, para que façais a mesma coisa que eu fiz” (Jo 13, 15). Para nós ali estava sendo celebrada a primeira missa, e sendo instituída a Eucaristia e o sacramento da Ordem. Jesus ainda vestido com o manto do serviço (avental), é levado a julgamento diante dos sacerdotes, do sinédrio, de Herodes e de Pôncio Pilatos.
Açoitado, corpo machucado e banhado de sangue revela a situação da humanidade. “Não tinha beleza nem atrativo para o olharmos, não tinha aparência que nos agradasse. Era desprezado como o último dos mortais, homem coberto de dores, cheio de sofrimentos: passando por ele, tapávamos o rosto; tão desprezível era, não fazíamos caso dele” (Is 52, 2-3). Contemplar Jesus crucificado é perceber o quanto somos fracos, pecadores e limitados. Jesus foi vítima da violência gananciosa das autoridades políticas e sacerdotais do seu tempo. Ele sofreu injustamente e sua paixão se prolonga ainda hoje nos sofridos deste mundo, nos excluídos do sistema econômico que oprime, mata e destruí os mais vulneráveis. O fato é que Jesus ainda hoje continua morrendo, suas chagas ainda se abrem em cada ser humano vitima da violência, das armas de fogo, dos acidentes de trânsito, em cada pessoa que morre sem assistência médica, vítima de um sistema de saúde falido.
Mas tudo esse sofrimento e sinais de morte não prevalecem até o fim. O rumo definitivo é o Sábado Santo, onde o canto do “exulte” rompe as trevas da nossa existência e ilumina com sua luz, a nossa condição miserável para nos introduzir novamente ao paraíso antes perdido e hoje desejado. “Ó noite em que Jesus rompeu o inferno, ao ressurgir da morte vencedor (...) Ó pecado de Adão indispensável, pois o Cristo o dissolve em seu amor”. A Vigília Pascal, é a “mãe de todas as vigílias”, celebrada sempre à noite, tem um significado todo especial.
O Ciclo Pascal se estende por cinquenta dias até a festa de Pentecostes. O Círio Pascal aceso em local de destaque nos remete à coluna de fogo que conduziu o povo pelo deserto até a libertação até a terra prometida e ao Cristo Ressuscitado e Vencedor.
Entretanto, bem sabemos que a Semana Santa vem sendo transformada em mais um evento em favor do comércio dos ovos de chocolate, do coelhinho dos presentes, dos vinhos caros e do bacalhau, sendo para muitos um simples “Feriadão”. Porém, cultivemos o espírito desta semana com o propósito de renovar em nós o significado maior da nossa existência e da nossa fé.
Com Maria, Nossa Senhora das Dores, percorramos o caminho da cruz e do martírio até chegar ao jardim da reconciliação, onde seremos interpelados: “Por que estais procurando entre os mortos aquele que está vivo?” (Lc 24, 5). Deixemos que a esperança tome conta de nós e que dissipe todo medo e angústia e que transforme a nossa realidade de dor e de pecado em luz e salvação.

* Teólogo, Geógrafo e Professor.

Campina Grande- PB
30 de março de 2009.