quinta-feira, 18 de novembro de 2010

QUESTÕES RELIOSAS NAS ELEIÇÕES 2010.

Nunca se constatou tanta influência das questões religiosas numa eleição, como estamos presenciando neste ano de 2010, principalmente no 2º turno. O fato é que a cultura do povo brasileiro, ainda com os pés fincados na colonização e no sistema do padroado, não tem consciência firme de que o Estado é laico, que a República é um sistema de governo diferente da Monarquia, onde no passado o representante maior estava sob domínio eclesiástico e vice versa.
Questões como o aborto, união civil entre pessoas do mesmo sexo e liberdade religiosa, estão sendo abordados com tanta veemência que outros temas considerados também importantes estão sendo esquecidos ou ofuscados. Temas como: a soberania nacional com relação à China (nova superpotência do século XXI), a relação diplomática, política e econômica com o Oriente Médio (Irã, Palestina e Israel), as reformas necessárias (a política, previdenciária, tributária e penal), as questões ambientais e socioeconômicas (inclusão social, desmatamento, resíduos sólidos, aquecimento global, educação, saúde, transporte, segurança e tantos outros) parece que ficaram em segundo plano, e que o que mais interessa no momento é simplesmente a troca de farpas, acusações; e assim os eleitores mais conscientes e exigentes sentem falta de propostas e debates mais profícuos.
Não se deve, em hipótese alguma, aceitar o aborto que, aliás, é um ato criminoso, intolerável e um atentado contra a dignidade humana; mas, por outro lado, reduzir o embate presidencial a temas religiosos é um equívoco de quem perdeu o rumo da democracia e da capacidade do diálogo, onde tudo é permitido para defender seus interesses.Diante de tantas acusações (contra ou favor do aborto), as Igrejas Cristãs, católica e evangélicas, se posicionam, tomam partido, indicam abertamente em quem seus fiéis e eleitores devem votar. Fato de causar espanto, tendo em vista que em eleições passadas as Igrejas não ultrapassavam o terreno da orientação sobre a compra e venda de votos. Pareciam mais livres e comprometidas com a verdade espírito do evangelho.
A verdade é que a eleição de 2010 mostra a verdadeira face de um Brasil altamente conservador, marcado por um alto grau de religiosidade, onde os privilégios eclesiásticos somam-se com os interesses de certas Igrejas para manterem suas estruturas de poder e de riqueza, numa “opção preferencial pelos ricos” e poderosos (grande mídia, empresas, latifundiários); e que temas teológicos abordados em plena campanha eleitoral tem muito mais haver com perdas desses privilégios do que com preocupação com os problemas nacionais.
Portanto, o sistema republicano e democrático de direito deve respeitar todas as pessoas que formam uma nação. Deve respeitar e governar em favor dos judeus, cristãos, mulçumanos, árabes, ateus, afro-descendentes, independemente de cor, nacionalidade, gênero e orientação sexual. Por isso, que os eleitores, fiéis ou partidários de Igrejas, pensem bem antes de votar, e que este gesto seja fruto de sua consciência livre e soberana.

CAMPINA GRANDE, 18 DE OUTUBRO DE 2010.

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ERALDO AMORIM