segunda-feira, 16 de março de 2009

IGREJA, EXCOMUNHÃO E MISERICÓRDIA

IGREJA , EXCOMUNHÃO E MISERICÓRDIA.
* Eraldo Amorim
Decidi aceitar o desafio de escrever sobre um assunto bastante delicado como este. Impulsionado por alguns artigos que li e por e-mails que recebi após os rumores de que o arcebispo de Olinda/Recife, teria excomungado a mãe e a equipe médica por permitir, amparados pela lei, de promover o aborto de gêmeos numa menina de nove anos, e que de maneira trágica teria sido violentada sexualmente pelo próprio padrasto, e por motivos biológicos poderia não levar a gravidez ao fim, podendo até morrer. O resto todos nós já sabemos. Este fato após repercutir mundialmente, o Vaticano e a CNBB se pronunciaram a favor de D. José Cardoso Sobrinho, “queimado” pela imprensa como sendo um arcebispo conservador, defensor doutrinário do Papa Bento XVI. Mas Houve uma reviravolta no caso. O presidente da Academia Pontifícia para a Vida, o arcebispo Rino Fisichella escreveu um artigo onde criticou a excomunhão. Falou-se em perdão, inclusão e misericórdia.
A palavra “Excomunhão” quer dizer fora da comum união (ex=fora), ou seja, é declarado excomungado aquela pessoa que não esteja de acordo com os princípios doutrinários da comunidade cristã. É bom deixar bem claro que a excomunhão é uma realidade que vem desde o inicio da Igreja (Mt 18, 15- 20; 1 Cor 5). Era a punição mais rígida que se poderia receber. Na Idade Média a excomunhão, por contexto histórico, foi muito aplicada para combater heresias, cismas, apostasia e até ataques a reis, príncipes e gente do clero. Como último recurso, o excomungado era imposto à fogueira da inquisição, pois só queimando o corpo teria a chance de purificar a alma.
A instituição católica tem a excomunhão ainda como forma de corrigir um eventual erro que venha atingir a integridade da religião e a dignidade da pessoa humana. Quando se pensa em excomunhão, é para o bem da própria pessoa, que uma vez não agindo conforme a doutrina do evangelho, e não atingindo o arrependimento necessário e permanecendo no erro pode ser condenada ao suplicio eterno (1 Cor 11, 27- 30). Excomungar é deixar a pessoa livre da doutrina, agindo conforme a sua consciência e não sob a doutrina cristã. Entretanto, excomunhão não é sinônimo de condenação, mas sim uma oportunidade para o arrependimento e consequentemente uma reabilitação na comunidade.
Esta é uma maneira de correção não entendida e não aceita pela modernidade secularizada e que só exige da Igreja atitudes que reforce a liberdade humana, sem compromisso, como se fosse tudo permitido. Na realidade busca-se vantagem em tudo, até da Igreja. Muitos de nós esperamos dela os sacramentos, celebrações pomposas, almejamos a Tradição pela tradição, desejamos adquirir status sociais, mas na hora de defender ou de viver a doutrina a acusamos de retrógrada, medieval, injusta e perversa. Ou seja, muitos só são católicos em busca da promoção pessoal e social, criando uma espiritualidade individualista e egoísta.
Por outro lado, não estamos mais na Idade Média, e a Igreja com seus dirigentes são suficientemente inteligentes para ter plena consciência disso. Os tempos mudaram e a teologia também se desenvolveu. Sendo a Igreja uma instituição de dois mil anos, tem o direito de expor a sua opinião sobre qualquer fato ou assunto. Mas no caso específico da menina de Pernambuco, a excomunhão foi totalmente contestada por se tratar de questão de vida ou de morte da infante. Grande desafio para a Igreja, que saiu em defesa das duas vidas que ainda iriam nascer sem olhar para a criança que já tem nove anos, e que tem como principio “os fins não justificam os meios”. Fato bastante delicado e que requer cautela e muito discernimento.
Em meio a grande polêmica que se formou, apelou-se para a misericórdia. É tempo da misericórdia, da graça e do diálogo (Lc 6, 36 – 38; Mt 12, 31; 2 Cor 2, 5 – 8). É missão da Igreja, testemunhar o amor infinito de Deus, e não espalhar medo e excluir aqueles que erram. Mas é também missão da Igreja defender a vida não importando as circunstâncias. Eis que o impasse está formado, a questão teológica continua. Quem poderá dizer como será o desenrolar desta questão? Desafio para os teólogos, médicos, cientistas e para todos os cristãos.
Campina Grande, 16 de março de 2009.
· Geógrafo, Teólogo e Professor.