domingo, 17 de maio de 2009

DOSSIÊ ÁGUA (PARTE I)

DOSSIÊ ÁGUA
FONTES CADA VEZ MAIS ESCASSAS
. O esgotamento das reservas hídricas do planeta não é causado por fatores naturais, mas pelo mau gerenciamento que fazemos das fontes e de seus usos. O planeta já enfrenta uma crise de água. O volume que circula por mares, rios e lagos, que é guardado nos depósitos subterrâneos, como gelo nas calotas polares ou em umidade da atmosfera, jamais diminui ou aumenta. No entanto, um recurso renovável não se mantém, necessariamente, inesgotável e de boa qualidade todo o tempo. Tudo depende do equilíbrio entre a renovação e o consumo. Muitos povos vivem em zonas áridas, e mesmo regiões com fartos recursos hídricos passam esporadicamente por secas que afetam os mananciais. Isso sempre foi assim, no decorrer da história. A diferença na situação atual, é que enfrentamos uma ameaça de escassez crônica de proporções globais, cuja grande causa são as atividades humanas. A crise da água é menos uma questão de escassez real e mais de mau gerenciamento do uso desse recurso. E a falta de água põe em risco não só a saúde humana como também o desenvolvimento socioeconômico e a paz de toda a sociedade. Do total de cerca de 1,39 bilhão de quilômetros cúbicos de água que revestem o globo, apenas 2,5% são de água doce. Além disso, a maior parte da água doce não está disponível ao homem – ou está congelada nas geleiras e calotas polares ou se encontra escondida em depósitos subterrâneos. A natureza não distribui a água de maneira equilibrada pelo mundo. Enquanto há regiões com recursos hídricos em abundância, outras não dispõem do mínimo diário de 20 a 50 litros por pessoa recomendado pela ONU, apenas para as necessidades básicas. É o caso do Brasil. O país é riquíssimo em recursos hídricos, mas o maior volume está na bacia amazônica, a região de menor densidade populacional. No outro extremo, capitais e regiões metropolitanas do Sudeste, como Rio de Janeiro, Belo Horizonte e São Paulo, de expressiva concentração demográfica, já está ameaçadas de escassez hídrica e são obrigadas a buscar água em bacias cada vez mais distantes. Ao contrário do volume de água do planeta, que jamais se altera – nem para mais, nem para menos – a população mundial cresce aceleradamente. Assim, para uma mesma quantidade de água existem mais e mais bocas sedentas. É fato: o desenvolvimento industrial tem grande peso na queda do nível dos rios e aqüíferos. Por isso, quando mais rica for uma população, maior será o consumo de água por cabeça. As emissões de carbono e as mudanças na paisagem, com a destruição de matas e a impermeabilização dos solos, alteram o regime das chuvas, desequilibrando o ritmo do ciclo hidrológico. Na Ásia Central cresce a tensão entre Tadjiquistão, Quirguistão e Uzbequistão em razão do uso compartilhado das reservas de água da região, que vêm se reduzindo dramaticamente: os glaciais do Tadjiquistão diminuíram sua área em um terço nos últimos 50 anos, e o Quirguistão perdeu mais de mil glaciares, no mesmo período. Na Nigéria, o saneamento básico é inexistente e o abastecimento de água da população depende dos fornecedores particulares, que vendem água doce de poços, lagos e regatos, nem sempre livres de contaminação.
FONTE: REVISTA ATUALIDADES, 1º SEMESTRE 2009. EDITORA ABRIL.

quinta-feira, 14 de maio de 2009

ORIENTE MÉDIO

SANGUE QUENTE
Vinte anos após o fim da Guerra Fria, zonas de conflitos persistem e espalham terror e morte por três continentes. Há duas décadas, a queda do Muro de Berlim sinalizava o fim da Guerra Fria, rivalidade entre os blocos liderados pelos Estados Unidos e pela União Soviética, que alimentava a tensão geopolítica global e dava combustível para os negócios da indústria armamentista. Mas, diferentemente do especulado, diversas partes do globo, continuam sendo cenários de guerras, e os fabricantes de armas prosseguem comemorando bons negócios.
Em 2007 cresceu o número de conflitos no mundo e os gastos militares subiram 6% em relação ao ano anterior. Desde 1998, as despesas mundiais com armamento militar aumentaram 45%. Os Estados Unidos foram responsáveis por quase metade (45%) desse total. Em 2007 o país gastou 547 milhões de dólares em armas, a maior quantia desde a II Guerra Mundial. A Índia e a China também ampliaram bastante seus gastos militares no último período. Entre 2003 e 2007, os países desenvolvidos como EUA, Reino Unido, Federação Russa, foram os maiores vendedores de armas, enquanto nações em desenvolvimento como China, Índia, Emirados Árabes Unidos, Coréia do Sul e Grécia, se tornaram os maiores compradores. As 100 maiores empresas armamentistas do planeta faturaram 315 milhões de dólares em 2006. A produção é fortemente concentrada: entre essas 100 companhias, 41 são dos Estados Unidos, e sua atividade é um dos pilares da economia do país.
O número de ataques terroristas também aumentou. Relatório do governo norte-americano mostra que em 2007 houve 14.499 atentados terroristas pelo mundo que resultaram em 22.685 mortes. Somente no Iraque foram mais de 6 mil ataques quase o dobro do registrado dois anos antes. Um dos fatores de renascimento das disputas étnicas é o fim do bloco soviético, no qual as aspirações nacionais de vários povos eram até sufocadas por um poder central forte. Nos 15 paises que surgem (Federação Russa, Cazaquistão, Ucrânia etc), diversos grupos levantaram a bandeira da independência, como ocorre na Chechênia, que luta para se libertar do Estado russo. No caso da guerra entre Federação Russa e a Geórgia, em 2008, o motivo é a declaração de independência da região da Ossétia do Sul em relação ao Estado georgiano, que recebe apoio dos russos (interessados em reforçar sua influência direta na região).
Com freqüência, conflitos étnicos estão vinculados a questões econômicas, como ocorre na África. Outros têm como pano de fundo o fortalecimento de grupos fundamentalistas. Esses movimentos que existem em diferentes religiões, buscam nos textos considerados sagrados a base para a organização da vida social e política. Exemplos são as atividades de facções fundamentalistas islâmicas em paises no centro-norte da África (Argélia, Sudão), no Oriente Médio (Líbano, Israel, Iraque) e na Ásia Central (Afeganistão). Entre os conflitos do mundo moderno, um dos mais prolongados é o que envolve israelenses e palestinos, em torno da existência do Estado de Israel, proclamado em 1948. Na última semana de 2008, o ataque israelense aos palestinos na Faixa de Gaza ganhou as manchetes de jornais no mundo todo. Em 27 de dezembro, Israel iniciou uma operação militar na área, densamente habitada por palestinos, sob a justificativa de dar um fim aos disparos de foguetes contra seu território, atribuídos ao movimento islâmico fundamentalista Hamas. Os foguetes causaram prejuízos, deixando alguns feridos. O ataque não foi surpresa porque, alguns dias antes, a trégua de seis meses com Israel havia sido rompida oficialmente pelo Hamas. O grupo alegou que os israelenses mantiveram, durante esse período, o bloqueio á Faixa de Gaza, impedindo a entrada ou saída de pessoas e mercadorias. Segundo a ONU, a situação provocou uma grave crise humanitária na Faixa de Gaza, devido à falta de alimentos, medicamentos e outros gêneros de primeira necessidade.
Os palestinos constituem o maior contingente de refugiados do mundo. Segundo a ONU, são 4,6 milhões de pessoas sem um território reconhecido como Estado. Atualmente, cerca de 1,5 milhão de palestinos espremem-se na Faixa de Gaza, uma faixa de 45 Km de comprimento e 10 Km de largura, com uma das maiores densidades populacionais do planeta e grande índice de pobreza – a maioria de seus moradores vive com menos de 2 dólares ao dia. Não há à vista uma paz duradoura na região. Além das grandes diferenças de pontos de vista entre o governo israelense, o presidente da Autoridade Nacional da Palestina (ANP), Abbas, e o Hamas, há os refugiados palestinos, que anseiam recuperar suas terras, na área em que fica Israel. Os israelenses não aceitam conversar sobre a volta dos refugiados a seu território.

Fonte: Revista Atualidades, 1º semestre 2009. Editora Abril, 2009.

ENTENDA A CRISE

ENTENDA A CRISE
Por Paulo Zocchi e Frances Jones
Iniciada nos EUA, turbulência se espalha, causando prejuízos, recessão e desemprego.
Trilhões de dólares de dinheiro público foram usados para salvar bancos e empresas. Até o futebol sentiu: no fim de 2008, poucos jogadores brasileiros de ponta forma vendidos à Europa, pois o dinheiro lá também ficou mais curto. Na atual época,da globalização, há uma interligação entre as economias de todas as nações, os capitais se movem em grande velocidade, bancos e empresas se associam e se fundem em diferentes países e continentes, e uma crise iniciada nos Estados Unidos, a economia mais poderosa do planeta – responsável por cerca de um quarto de tudo que é produzido no mundo – afeta todos os mercados em questão de horas. Não é fácil entender tudo, mas isso ocorre porque o mercado financeiro, que movimenta centenas de trilhões de dólares por ano, é de fato muito complicado.
2001. O Banco Central dos EUA baixou os juros a partir de 2001, o primeiro ano do governo de Bush, justamente para estimular a economia, incentivando a expansão da produção e do consumo. Com a queda dos juros, que pesam bastante em financiamentos de longo prazo, começaram a ser concedidos muitos empréstimos para a compra de casas a pessoas com menos poder aquisitivo – os clientes classificados de “subprime”. Isso impulsionou a expansão no país da construção civil e do mercado imobiliário. Durante o período em que os juros ficaram baixos, esse mecanismo funcionou bem. Isso ocorreu de 2001 a 2004, com a taxa de juros norte-americana variando num patamar baixo, entre 1,75% e 1% ao ano.
2002 /2003. Os empréstimos imobiliários foram se multiplicando e atingindo grande volume financeiro. Com as prestações sendo pagas, a cada mês, essas operações se tornaram bastante lucrativas para bancos e empresas de créditos imobiliários. Com a ampliação dos crédito imobiliário, cresceu a procura –em linguagem econômica: aumentou a demanda – por casas e apartamentos, fazendo com que os imóveis se valorizassem. As aplicações na construção civil também se tornaram um ótimo negócio para investidores, atraindo capitais do mundo todo e ajudando a movimentar o mercado norte-americano.
2004. A economia norte-americana passa a registrar sinais de inflação.Umas das fontes da inflação é o endividamento vertiginoso do Estado norte-americano, graças, sobretudo, ao corte nos impostos das rendas mais altas – que havia sido feito pelo presidente Bush para impulsionar a economia - e os gastos astronômicos de 2001, principalmente com o envio de tropas ao Afeganistão (a partir de 2001) e ao Iraque (2003). Para combater a inflação, o Fed começou a elevar a taxa básica de juros a partir de outubro de 2004. Uma das conseqüências da subida dos juros, porém, é que o valor das prestações dos empréstimos imobiliários passou a subir cada vez mais para o cidadão comum.
2006/2007. Entre junho de 2006 e agosto de 2007, a taxa de juros ficou em 5,25% ao ano, até cinco vezes maior que a do período anterior. Com as prestações mais caras, uma parte crescente dos compradores não conseguiu mais pagá-las. Assim, os bancos começaram a tomar de volta judicialmente os imóveis de quem parou de pagá-las, promovendo despejos dramáticos por todo o país e recolocando casas e apartamentos à venda. O aumento súbito da oferta, somado ao encarecimento dos empréstimos, derrubou o preço dos imóveis. Como muitos empréstimos deixaram de ser pagos, e o valor dos imóveis dados como garantia despencou, os títulos com base nos empréstimos perderam valor rapidamente, causando grandes prejuízos a bancos e a empresas imobiliárias.
2008. O estopim da atual faze da crise ocorreu em 15 de novembro de 2008, com a queda do quarto maior banco de investimentos norte-americano, o Lehman Brothers – instituição tradicional, com 158 anos, que havia investido fortemente em títulos ligados aos empréstimos “subprime”. Em cerca de um ano, o valor de suas ações já havia despencado 95%. A quebra do Lehman- que não recebeu ajuda estatal – afetou diretamente outros bancos, fundos de pensão e empresas ligadas a ele nos EUA e no exterior. Mas amplamente abalou todo o mercado mundial, pois havia o medo de que outros bancos tivessem o mesmo destino. O mercado de empréstimos em dólar parou totalmente. Diante dos riscos ao mercado financeiro global – que, para funcionar, depende da credibilidade para que os compromissos sejam cumpridos- os governos da principais potências decidiram intervir de forma inédita, colocando trilhões de dólares de dinheiro público para auxiliar maciçamente as empresas em dificuldades. Ao injetarem dinheiro nas instituições, para que possam reembolsar parte de seus clientes e pagar suas dívidas mais urgentes, os governos tentam evitar uma maré de empresas quebradas.
Fonte: Revista Atualidades, 1º semestre 2009.

segunda-feira, 11 de maio de 2009

OS CAMINHOS DA ÍNDIA

OS CAMINHOS DA ÍNDIA.
Por Denise Odorissi.

Assentada em uma cultura tradicional e reverenciada por ser o berço do hinduísmo e do budismo, a Índia do século XXI surpreende ao avançar em muitos outros domínios. Avança a excelência na indústria farmacêutica, nos setores de fibras ópticas, satélites e informática- chegando a liderar a exportação mundial de softwares – e ostenta uma exuberante produção cinematográfica em sua Bollywood, num trocadilho com a rival norte-americana Hollywood. Com quase 1,2 bilhão de habitantes, a Índia abriga a segunda maior população do planeta, depois da China. Sua condição de potência nuclear, associada aos graves conflitos internos e externos- em especial com o Paquistão – é outro motivo para que o país ocupe um espaço privilegiado no tabuleiro geopolítico mundial. O território indiano ocupa a maior parte de uma vasta planície que, isolada do restante da Ásia pela cordilheira do Himalaia, forma o Subcontinente Indiano, de solo fértil e muitos recursos minerais. O rio Ganges, considerado sagrado pelos hindus, fornece ao país a água para uma forte produção agrícola.
O domínio da região pelo Império Britânico teve inicio em 1690, com a fundação de Calcutá, mas só se consolidou após 1763, ao final de uma guerra com a França. Em 1857, o território hoje pertencente ao Paquistão também foi incorporado às possessões britânicas. Durante o século XIX, várias rebeliões anticolonialistas foram sufocadas pelos ingleses. Em 1885, uma elite nativa de educação ocidental formou o Partido do Congresso, dominante até hoje. Vinte anos depois, o líder mulçumano Muhammad Ali Jinnah fundou a Liga Mulçumana do Paquistão (PML), que loso se aliou aos nacionalistas hindus na luta pela libertação da Coroa britânica. Em 1920 ocorreram os primeiros choques entre a Liga e as comunidades hindus, que compõem a maioria étnica e religiosa na Índia. Como reação ao crescimento das lutas pela independência, o império britânico estimulou os embates entre hindus e mulçumanos. Na época, o PML passou a lutar pela constituição de um Estado mulçumano separada da Índia. Por fim, em 1947, quando os britânicos foram obrigados a deixar o Subcontinente Indiano, encerrando sua dominação, eles decidiram aprovar sua divisão, por critérios religiosos, em dois Estados independentes – a Índia (com maioria de população hindu) e o Paquistão (com maioria mulçumana). Como era esperado, a partilha com base na religião resultou no deslocamento forçado e gigantesco de 10 milhões de pessoas em direções opostas da nova fronteira e amplificou os choques entre hindus e mulçumanos, causando a morte de pelo menos 1 milhão de habitantes. A contragosto, Gandhi acabou aceitando a divisão do país e, sob esse pretexto, foi assassinado por um fundamentalista hindu, em 1948.
Disputa pela Caxemira. Parte do norte da Índia e do noroeste do Paquistão, a Caxemira é disputada desde a independência pelos dois paises. Os conflitos já deixaram milhares de mortos. O território tem maioria muçulmana. O governo indiano acusa o governo vizinho de treinar e amar os guerrilheiros que agem na região. A disputa acirrou-se a partir dos anos 1950, em razão da política da Guerra Fria, quando a Índia ganhou o apoio da União Soviética e o Paquistão dos Estados Unidos. Em 1974, a Índia explodiu sua primeira bomba atômica, feito que o Paquistão só iria igualar 25 anos depois.
Pobreza. Em rápida ascensão econômica, a Índia se destaca como um dos principais países emergentes. Porém, tem péssimos índices sociais. Quase da metade das crianças não é vacinada contra o sarampo, e o analfabetismo ainda atinge 35% dos indianos. Seu IDH, divulgado em 2008, coloca a Índia no 132º lugar, entre os 179 paises pesquisados. Atualmente, a nação tem na Presidência uma mulher, Pratibla Patil, eleita em 2007, a primeira a ocupar esse cargo na história do país. Como o regime indiano é parlamentarista, o chefe de governo é o primeiro ministro Manmohan Singh – ambos do tradicional Partido do Congresso. A china sonha grande. Busca lugar de destaque no cenário internacional: ao lado de Brasil, Japão e Alemanha, integra o G-4, que pleiteia um lugar permanente no Conselho de Segurança da ONU. Mas, para chegar bem ao futuro, será preciso superar o abismo que separa as centenas de milhões de miseráveis dos que têm acesso à boa educação e um bom padrão de vida. A Índia não é o único país a enfrentar um desafio desse tipo.
Fonte: Revista Atualidades, 1º Semestre 2009. Editora Abril, 2009.